“Não haverá traje de homem na mulher, e não vestirá o homem vestido de mulher, porque qualquer que faz isto é abominação ao Senhor teu Deus.” Deuteronómio 22:5
Questão
Durante muito tempo se pensou que as calças seriam a veste própria masculina, enquanto os vestidos seriam a veste própria feminina. Onde está o verdadeiro sentido no trecho supra?
Contexto bíblico
As vestes eram semelhantes para ambos os sexos entre os hebreus. Ambos usavam vestidos e túnicas, embora de cores diferentes para distinguir os sexos. Em Deuteronómio 22:5 há uma advertência quanto ao uso de roupas entre os israelitas: “A mulher não usará roupa de homem, nem o homem veste peculiar à mulher; porque qualquer que faz tais coisas é abominável ao Senhor teu Deus”. O termo hebraico que aqui aparece para roupa ou veste é “simlâh” que se encontra também em Gn 9:23 para referenciar a capa com que os filhos de Noé o cobriram, e em Dt 22:17 para mencionar a roupa com que a moça se cobriu, e serviria de prova da sua virgindade. O que aqui se diz na realidade é que não usará o homem a capa da mulher, nem esta a do homem. Ou literalmente: “Não haverá objectos masculinos sobre uma mulher, e, não vestirá o homem manto feminino…”
A diferença no tecido e nas cores deve ter sido notável para que não houvesse engano provável. Ainda que fossem semelhantes, as vestes não serviam para ambos os sexos, como actualmente parece acontecer. Cremos que se pode seguir a mesma regra em todos os tempos. Verificamos neste costume bíblico alguma instrução para os homens de hoje usarem vestidos? Da mesma forma não vemos nele algum impedimento para a modificação das vestes femininas desde que se distingam das masculinas. A mulher veste a sua roupa, e o homem a sua, respectivamente.
E quantas modificações têm sofrido as nossas roupas na história do vestuário? Se assim não fora, andaríamos ainda de pano enrolado ao tronco à espera da última moda, ou até mesmo com as peles como o homem primitivo. Jesus não falou da maneira de vestir a quem quer que fosse. Há, porém, uma referência a roupas, quando Ele aconselha a que não haja inquietação pelo que havemos de vestir (Mt 6:31), mas isto é uma chamada de atenção para a abundância do Seu Reino. S. Paulo aconselha as mulheres cristãs a trajar com modéstia e decência (1 Tm 2:9). A ênfase é dada ao conjunto da apresentação da mulher que, embora com bom gosto, não deve fazer-se notar pelos vestidos luxuosos ou pelas jóias que ostenta, mas sim por obras de justiça. O mesmo conselho lhes dá o apóstolo Pedro (1 Pd 3:3). Em ambas referências não é proibido o adorno, visto que a ênfase, no contexto, vai para o comportamento moral da mulher. Claro que se alguém se apresenta na congregação extravagantemente adornado, será um insulto aos mais pobres.
Os véus que as mulheres hebreias usavam exigem que nos debrucemos um pouco sobre eles. Numa concordância hebraica encontramos três véus nomeados por termos diferentes, que passamos a expor:
a) “Mitpahath” é o manto que a viúva Rute usou para carregar seis medidas de cevada (Rt 3:15). Era semelhante à toga romana que cobria a cabeça e grande parte do corpo.
b) “Tsaiyph” foi usado pela donzela Rebeca quando se encontrou com Isaque e ainda pela viúva Tamar para enganar seu sogro fazendo-se passar por prostituta (Gn 24:65 e 38:14,19). Este véu cobria-lhe o rosto e de tal forma que Judá não a reconheceu.
c) “Radiyd” era um véu de grandes dimensões, de tecido fino, usado pelas senhoras, e encontra-se mencionado em Cantares 5:7 e Isaías 3:23. Na Arménia as mulheres solteiras cobriam somente o queixo, as casadas metade das suas faces, e isto, na sua maioria, como um sinal de sujeição. Supõe-se ser este o véu mencionado por S. Paulo aos coríntios em virtude de sua grafia e som serem bastante semelhantes ao verbo “ter domínio sobre”.
Levantar o véu a uma virgem tomava-se um grande insulto, enquanto tirar o véu a uma mulher casada era uma das maiores indignidades que se podia receber. E, realmente, as palavras do apóstolo em I Co 11 revelam este sentido.
Conclusão
Jamais descuremos a realidade de muitos costumes serem próprios de povos específicos, sujeitos a alterações ao longo dos séculos, de acordo com o desenvolvimento da sua própria cultura e condição social. Não há, por conseguinte, motivo para serem usados por outros povos com outras culturas. Os próprios povos bíblicos abandonaram muitas práticas ancestrais, inserindo-se no contexto social contemporâneo. É mister, portanto, extrair o ensino espiritual e moral da mensagem bíblica e não ficar escravo da letra.