“Ora, se eu, o Senhor e Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns aos outros. Porque eu vos dei exemplo, para que, como eu vos fiz, façais vós também.” João 13:14,15
Questão
Segundo o trecho acima, teremos nós obrigados pelo Senhor a lavar os pés uns aos outros, até mesmo por ritual, ou aquela ordenança poderá ser cumprida doutra forma?
Contexto bíblico
Concernente à recepção dos hóspedes, os hebreus tinham um costume muito característico. Quando alguém chegava, era saudado com um beijo, era trazida uma bacia com água e uma toalha para lavar os pés e, ao mesmo tempo, era derramado óleo perfumado sobre a cabeça: “E, voltando-se para a mulher, disse a Simão: Vês tu esta mulher? Entrei em tua casa, e não me deste água para os pés; mas esta com suas lágrimas os regou e com seus cabelos os enxugou. Não me deste ósculo; ela, porém, desde que entrei, não tem cessado de beijar-me os pés. Não me ungiste a cabeça com óleo; mas esta com bálsamo ungiu-me os pés.” (Lc 7:44–46). Jesus repreendeu Simão porque não praticara tal acto em sinal de amizade e hospitalidade. A respeito do lava-pés, encontramos essa prática em Gn 24:32, quando Labão recebeu o servo de Abraão e exerceu esse costume cultural: “Então veio o homem à casa, e desarreou os camelos; deram palha e forragem para os camelos e água para lavar os pés dele e dos homens que estavam com ele. Depois puseram comida diante dele.”
O apóstolo João menciona no seu evangelho que Jesus lavou os pés aos seus discípulos e ordenou que fizessem o mesmo uns aos outros, conforme trecho supra. E Paulo recomenda que só devem ser inscritas na beneficência da igreja as viúvas que tenham lavado os pés aos santos (1 Tm 5:10), o que prova ter sido o costume entre os cristãos primitivos.
Sabendo que os caminhos eram poeirentos e o calçado simples sandálias, havia necessidade de providenciar esta higiene e, além disso, refrescar e revigorar os pés cansados da caminhada. Jesus, ao praticar este acto, dá-nos uma lição de humildade e, ao mesmo tempo, de amizade. Sendo Senhor, curva-se perante os discípulos e serve-os como escravo. Igualmente, prova-lhes a Sua amizade pela maneira como os serve, praticando o gesto de um bom hospedeiro, mesmo sem o ser na realidade. Ele supriu a falha do verdadeiro anfitrião.
Hoje não sentimos mais a necessidade de lavar os pés uns aos outros, a menos que estejamos, nós mesmos, incapazes de o fazer; mas podemos encontrar outras maneiras de manifestar a nossa humildade e amizade, servindo-nos uns aos outros de acordo com as necessidades da época, sobretudo sendo bons hospitaleiros. Poderemos estar atentos e suprir as necessidades dos irmãos.
Em referência ao beijo da saudação teremos a dizer que este era um sinal de afeição, amizade, reverência e submissão. O beijo poderia ser dado na boca, na face ou na mão, conforme a intenção. Reverência e submissão seriam manifestadas pelo beijo na mão, enquanto a amizade era declarada pelo beijo na face. Esta prática e recomendada aos cristãos, conforme se lê em: (Rm 16:16; 1 Co 16:20; 2 Co 13:12; 1 Ts 5:26; 1 Pd 5:14).
Em todas as suas passagens, Paulo ordena que se saúdem com o beijo santo, e Pedro manda que se saúdem com o beijo do amor. Crê-se que por causa dos abusos, homens beijavam homens e mulheres beijavam mulheres. Hoje, no ocidente as mulheres saúdam-se com o tradicional beijo, enquanto os homens apertam a mão, sendo esta a prática entre os cristãos. O que importa é que se manifeste verdadeira fraternidade e amizade.
Quanto à prática da oração, observamos pela Bíblia que naqueles tempos levantavam os olhos e as mãos para o Céu. Jesus, tomando os cinco pães e os dois peixes, levantou os olhos ao Céu e abençoou-os (Mt 14.19). O apóstolo Paulo aconselha os homens a orar levantando mãos santas (1 Tm 2:8). Todavia, a ênfase está na isenção da ira e da contenda e não nas mãos levantadas. O que importa é orar e ser ouvido por Deus.
Conclusão
Estes apontamentos servem para chamar a atenção para a realidade de que muitos costumes são próprios de um povo e de uma época, sujeitos a mudanças de acordo com o desenvolvimento da cultura e da condição social, não havendo, por isso, motivo para se imporem a outros povos e de outras condições. Os próprios povos bíblicos abandonaram muitas práticas ancestrais, inserindo-se no contexto social contemporâneo. É mister, portanto, extrair o ensino espiritual e moral da mensagem bíblica e não ficar escravo da letra.