Existe um grande desconhecimento acerca do real significado do perdão. Uns dizem que perdoam mas não esquecem. Outros alegam que perdoam, mas não deixam de mencionar constantemente a falta dos outros, esquecendo que isso é já uma falta muito grande. Além disso não atentam para o conselho do Senhor que disse. “Não julgueis para não serdes julgados” (ou, não condeneis para não serdes condenados). Ainda outros afirmam que dita pessoa não merece o perdão, esquecendo também que eles mesmos não são merecedores do perdão divino.
Afirmamos pelas Sagradas Escrituras que estes perderam o direito ao perdão pelo simples facto de o negarem realmente aos seus companheiros ou irmãos. O perdão não consta de palavras ditas, mas de atitudes e acções correspondentes ao amor e à misericórdia. Quem desta maneira prática não revela amor e misericórdia, como estará nele o Espírito Santo de Deus? E porque o Espírito de Deus não está nele é que não pratica as acções de Deus, como o perdão à Sua maneira.
Israel caiu no pecado da idolatria que a arrastou para outros pecados, e ofendeu deste modo o Deus santo, que considerou essa afronta como prostituição e adultério. (cf. Ez 16.32–34). Todavia, o misericordioso Senhor convida constantemente Israel a voltar para Ele com a promessa de lhe perdoar totalmente e purificar de todo o pecado. (cf. Oseias 14.1–9). Observar ainda as palavras de Crónicas: “se o meu povo, que se chama pelo meu nome, se humilhar, e orar, e buscar a minha face, e se desviar dos seus maus caminhos, então eu ouvirei do céu, e perdoarei os seus pecados, e sararei a sua terra.” (2 Cr 7.14).
Amor
O carácter do perdão é composto por várias características como: Compaixão, bondade, generosidade, benignidade, misericórdia e prontidão. Confirmemos isto pelas Escrituras: Isaías alega que Deus é compassivo e generoso para perdoar, com as seguintes palavras: “Deixe o ímpio o seu caminho, e o homem maligno os seus pensamentos; volte-se ao Senhor, que se compadecerá dele; e para o nosso Deus, porque é generoso em perdoar.” (Is 55.7). Quando perdoa, Ele perdoa tudo e purifica para sempre, conforme está escrito: “E os purificarei de toda a iniquidade do seu pecado contra mim; e perdoarei todas as suas iniquidades com que pecaram e transgrediram contra mim.” (Jr 33.8).
Deus está sempre pronto e é benigno para conceder perdão, mesmo a quem o não merece, de acordo com o salmista: “Porque tu, Senhor, és bom, e pronto a perdoar, e abundante em benignidade para com todos os que te invocam.” (Sl 86.5). Além disso, o Senhor assegura que lança tudo isso no esquecimento: “Porque serei misericordioso para com suas iniquidades, e de seus pecados não me lembrarei mais.” (Hb 8.12). Isto não significa que Ele seja esquecido, mas que não é prática Sua repescar o que lançou nas profundezas do mar.
Graça
Ainda que a transgressão seja grande, a graça divina é ainda maior, e teria que ser, para superar a gravidade do pecado, como escreveu Paulo: “Sobreveio, porém, a lei para que a ofensa abundasse; mas, onde o pecado abundou, superabundou a graça.” (Rm 5.20). A graça divina é manifestada pelo favor de Deus em perdoar sem o merecermos. O Senhor jamais concede qualquer perdão pelo mérito humano; o perdão depende exclusivamente da Sua misericórdia e do Seu favor. Ora, favor é um serviço prestado sem intuito de qualquer remuneração. Assim, também Deus não faz depender o Seu perdão daquilo que possamos fazer em contrapartida.
Uma óptima ilustração encontra-se no facto de terem levado a Jesus uma mulher acusada de adultério, que devia ser condenada, e Ele desarmou os acusadores deste modo: “Aquele dentre vós que está sem pecado seja o primeiro que lhe atire uma pedra.” (Jo 8.7). Neste aspecto, o apóstolo escreveu o seguinte: “Se dissermos que não temos pecado nenhum, enganamo-nos a nós mesmos, e a verdade não está em nós.” (1 Jo 1.8).
Ninguém há que não tenha pecado e possa ser acusado de qualquer transgressão, porém, “Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça.” (1 Jo 1.9). A graça divina é composta por fidelidade e justiça, isto é, Deus permanece inalterável a respeito da Sua promessa acerca do perdão, e espera que Seus filhos sejam semelhantes neste procedimento, “Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celestial vos perdoará a vós.” (Mt 6.14). O Senhor assegurou que há perdão para todo o pecado, com excepção de um somente, a blasfémia contra o Espírito Santo. (Mt 12.31).
Prontidão
Geralmente, as pessoas não estão prontas a perdoar, e se o fazem, é simplesmente por palavras, sempre com alguma reserva, com bastante dificuldade. Ora, este não é o perdão concedido por Deus, como havemos observado anteriormente. Certa vez, Pedro apresentou ao Senhor a seguinte questão: “Senhor, até quantas vezes pecará meu irmão contra mim, e eu hei-de perdoar? Até sete? Respondeu-lhe Jesus: Não te digo que até sete; mas até setenta vezes sete.” (Mt 18.21,22). Lucas corrobora o mesmo ensino com estas palavras: “Mesmo se pecar contra ti sete vezes no dia, e sete vezes vier ter contigo, dizendo: Arrependo-me; tu lhe perdoarás.” (Lc 17.4).
Alguns alegam que só Deus pode perdoar pecados e deixam a árdua tarefa do perdão com Ele. Mas o Senhor contou uma esclarecedora parábola sobre a obrigação de cada qual perdoar ao seu ofensor, cujo consta em Mateus 18.23–35. Jesus ensina ali que quem recebeu perdão de Deus, deve estar pronto a conceder perdão ao seu próximo; ou o perdão lhe será retirado e, como consequência, receberá o devido e justo castigo.
Igualmente Paulo ensinou a Igreja no dever de perdoar certo transgressor: “De maneira que, pelo contrário, deveis antes perdoar-lhe e consolá-lo para que ele não seja devorado por excessiva tristeza. Pelo que vos rogo que confirmeis para com ele o vosso amor.” (2 Co 2:7). A fé deve ser acompanhada pelo amor, o qual é a manifestação prática da presença de Deus em nossa vida. E o amor é compassivo, benigno e fraterno; é Deus em nós. E o apóstolo Pedro escreveu acerca duma lista de virtudes cristãs: “Pois aquele em quem não há estas coisas é cego, vendo somente o que está perto, havendo-se esquecido da purificação dos seus antigos pecados.” (2 Pd 1:9).
Conclusão
O perdão é, por conseguinte, uma característica do cristão fiel, que está sempre pronto a concedê-lo, ainda que para isso tenha de fazer algum sacrifício. Consideremos, porém, que o perdão que temos recebido custou muito mais caro ao Senhor Jesus. Ele entregou a sua vida para morrer numa cruz, lugar de vergonha e sofrimento atroz, para nos perdoar, justificar e purificar de todo o pecado. Agora temos a obrigação de, como discípulos, seguir o seu exemplo para O revelarmos às outras criaturas. Pois só deste modo O conhecerão. Então, revelemos amor, graça e prontidão em perdoar à semelhança de Deus.