VÓS SOIS DEUSES?

Respondeu-lhes Jesus: Não está escrito na vossa lei: Eu disse: Vós sois deuses? Se a lei chamou deuses àqueles a quem a palavra de Deus foi dirigida (e a Escritura não pode ser anulada), àquele a quem o Pai santificou e enviou ao mundo, vós dizeis: Blasfemas; porque eu disse: Sou Filho de Deus?” João 10:34–36

Questão

Em virtude duma interpretação demasiado literal do verso trinta e quatro, sem examinar o contexto bíblico, está circulando a ideia de que somos pequenos deuses. Valem-se daquilo que o trecho diz, corroborando ainda essa ideia pelo facto de sermos filhos de Deus e de Jesus o ter usado com o mesmo sentido. Ora, isso obriga-nos a examinar o contexto bíblico para encontrar o verdadeiro sentido do referido trecho.

Contexto bíblico

O trecho supra não pode significar que somos deuses porque não pode haver outro deus além de Jeová, conforme Êxodo 20:2,3 que diz: “Eu sou o Senhor teu Deus que te tirei da terra do Egipto, da casa da servidão. Não terás outros deuses diante de mim.”

Após o grande milagre de Elias, o povo exclamou que só Jeová é Deus; cf. 1 Rs 18:39. Os judeus nem sequer aceitavam que Jesus fosse filho de Deus, como poderia Ele referir-se a nós como sendo pequenos deuses?! De acordo com Jo 10.33: “Responderam-lhe os judeus: Não é por nenhuma obra boa que vamos apedrejar-te, mas por blasfémia; e porque, sendo tu homem, te fazes Deus.”

Os seres criados por Deus não podem ser deuses, mas primícias das suas criaturas, como está escrito: “Segundo a sua própria vontade, ele nos gerou pela palavra da verdade para que fôssemos como que primícias das suas criaturas.” (Tg 1:18).

Certa vez, Paulo e Barnabé rejeitaram a ideia de serem tratados como deuses. Observemos o referido trecho: “As multidões, vendo o que Paulo fizera, levantaram a voz, dizendo em língua licaónica: Fizeram-se os deuses semelhantes aos homens e desceram até nós. A Barnabé chamavam Júpiter e a Paulo Mercúrio, porque era ele o que dirigia a palavra. O sacerdote de Júpiter, cujo templo estava em frente da cidade, trouxe para as portas touros e grinaldas e, juntamente com as multidões, queria oferecer-lhes sacrifícios. Porém, quando, os apóstolos Barnabé e Paulo ouviram isto, rasgaram as suas vestes e saltaram para o meio da multidão, clamando e dizendo: Senhores, por que fazeis estas coisas? Nós também somos homens, de natureza semelhante à vossa, e vos anunciamos o evangelho para que destas práticas vãs vos convertais ao Deus vivo, que fez o céu, a terra, o mar, e tudo quanto há neles.” (At 14:11–15).

Esta ideia foi criada por Satanás, quando usou astúcia para tentar Eva a desobedecer a Deus: “Disse a serpente à mulher: Certamente não morrereis. Porque Deus sabe que no dia em que comerdes desse fruto, vossos olhos se abrirão e sereis como Deus, conhecendo o bem e o mal.” (Gn 3:4,5). Pelo contexto posterior sabemos que aconteceu o oposto: perderam a imagem de Deus, que lhes havia sido transmitida.

A narração de Isaías acerca da profecia contra o rei da Babilónia conta o seguinte: “E tu dizias no teu coração: Eu subirei ao céu; acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono; e no monte da congregação me assentarei, nas extremidades do norte. Contudo levado serás ao Seol, ao mais profundo do abismo.” (14:13–15).

O trecho não pode significar que somos deuses porque o contexto imediato no Salmo 82, reproduzido aqui integralmente, e sem numeração, aponta serem os juízes de Israel:

“Deus está na assembleia divina; julga no meio dos deuses. Até quando julgareis injustamente e tereis respeito às pessoas dos ímpios? Fazei justiça ao pobre e ao órfão, procedei rectamente com o aflito e o desamparado. Livrai o pobre e o necessitado, livrai-os das mãos dos ímpios. Eles nada sabem, nem entendem; andam vagueando às escuras; abalam-se todos os fundamentos da terra. Eu disse: Vós sois deuses, e filhos do Altíssimo todos vós. Todavia, como homens, haveis de morrer e, como qualquer dos príncipes, haveis de cair. Levanta-te, ó Deus, julga (ou governa) a terra; pois a ti pertencem todas as nações.”

Como observamos acima, os líderes de Israel são acusados de fazer acepção de pessoas e de não julgarem justamente os pobres e os órfãos. (cf. vv 2,3). O trecho recorda-lhes que são representantes de Deus para julgarem com justiça, (cf. vv 6,7). A palavra hebraica usada nos versos 1 e 6 é ‘Elohim’ deuses, isto é representantes de Deus. Eles são os poderosos que receberam o poder de representar Deus no juízo (ou governação).

O trecho não pode significar que somos deuses porque o contexto bíblico geral aponta serem os juízes de Israel. Deus estabeleceu juízes em todas as cidades de Israel para julgarem com justiça, e são apresentados na Bíblia como ‘Elohim’, o plural de Deus. Observemos o trecho de Êxodo 22:8,9, onde os juizes são referidos três vezes como ‘Elohim’: “Se o ladrão não for achado, então o dono da casa irá à presença dos juízes para se verificar se não meteu a mão nos bens do seu próximo. Em todo o caso de transgressão, seja a respeito de boi, ou de jumento, ou de ovelhas, ou de vestidos, ou de qualquer coisa perdida de que alguém disser que é sua, a causa de ambas as partes será levada perante os juízes; aquele a quem os juízes condenarem pagará o dobro ao seu próximo.”

Este foi o conselho dado por Moisés aos juízes: “Não fareis acepção de pessoas em juízo; de um mesmo modo ouvireis o pequeno e o grande; não temereis a face de ninguém, porque o juízo é de Deus; e a causa que vos for difícil demais, a trareis a mim, e eu a ouvirei.” (Dt 1:17). E isto é o que Deus diz acerca de Si mesmo: “Meu é o conselho e a verdadeira sabedoria; eu sou o entendimento; minha é a fortaleza. Por mim reinam os reis, e os príncipes decretam o que é justo. Por mim governam os príncipes e os nobres, sim, todos os juízes da terra.” (Pv 8:14–16).

Eis o que Deus diz acerca da autoridade delegada: “Toda alma esteja sujeita às autoridades superiores; porque não há autoridade que não venha de Deus; e as que existem foram ordenadas por Deus.” (Rm 13:1). “porquanto ela é ministro de Deus para teu bem. Mas, se fizeres o mal, teme, pois não traz debalde a espada; porque é ministro de Deus, e vingador em ira contra aquele que pratica o mal.” (Rm 13:4).

Deus aconselhou Jeremias a falar ao rei de Judá o seguinte: “Ouve a palavra do Senhor, ó rei de Judá, que te assentas no trono de Davi; ouvi, tu, e os teus servos, e o teu povo, que entrais por estas portas. Assim diz o Senhor: Exercei o juízo e a justiça, e livrai o espoliado da mão do opressor. Não façais nenhum mal ou violência ao estrangeiro, nem ao órfão, nem à viúva; não derrameis sangue inocente neste lugar.” (Jr 22:2,3).

Conclusão

Por conseguinte, o trecho não pode significar que somos deuses porque o contexto bíblico e histórico-cultural aponta serem os juizes de Israel. Na antiguidade reis e imperadores consideravam-se filhos dos deuses, ou deuses incarnados para serem obedecidos e cultuados. Aquele trecho não pode significar que somos deuses porque não se refere a nós. Ser filhos de Deus é o máximo grau que recebemos pela fé em Cristo, conforme expresso João 1:12: “Mas, a todos quantos o receberam, aos que crêem no seu nome, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus; Gálatas 3.26: “Pois todos sois filhos de Deus pela fé em Cristo Jesus.”

E Gl 4.5–7: “mas, vindo a plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido debaixo de lei, para resgatar os que estavam debaixo da lei, a fim de recebermos a adopção de filhos. E, porque sois filhos, Deus enviou aos nossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: Aba, Pai. Portanto já não és mais servo, mas filho; e se és filho, és também herdeiro de Deus por Cristo.”

Para ler mais temas, procurar na página Estante, os  livros ‘Haja Luz ’ e ‘Medita Nestas Coisas’.

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